A moça misteriosa
Numa cidade viviam três rapazes que se davam muito entre eles e que não se largavam nunca
Moravam todos juntos numa casa, assim que nem uma espécie de república de estudantes.
Eram muito farristas e mulherengos. Era só chegar sábado, já procuravam saber onde é que tinha algum baile ou festa pra irem. E não faziam conta de andar; podia ser léguas longe, davam um jeito e iam.
E tinha um dele que era o valentão do bloco; não tinha medo de nada.
Uma ocasião foram a pé num baile bem longe. Chegaram lá, a festa estava muito boa e os três amigos se divertiam muito. O baile estava cheio de moças bonitas e eles, então, faziam até apostas pra ver quem tirava uma ou outra que tinham achado mais linda.
Quando bateu meia-noite, o que tinha mais juízo, lembrando na pernada que tinham que fazer pra voltar, lembrou a todos que já era hora de irem andando. Mas quê!, os outros nem deram confiança. A festa estava que estava mesmo de arromba.
Daí bate uma hora, duas horas, três horas... Quando foi três e meia, viram mesmo que era bom irem embora.
E vieram, então, pela estrada, cantando e dando risada e falando: "você viu que "boa" que era aquela?", "você chegou a beijar aquela morena?". Assim.
Quando entraram na cidade, naquela hora com ninguém na rua e já batendo quatro horas na igreja, viram, andando na frente deles, uma moça muito bonita, de salto alto, vestido azul e cabelo bem arrumado.
Assobiaram pra ela e ela nada; continuou andando.
Daí um deles disse:
- Olhe. Vamos fazer uma aposta: eu quero ver quem é que é capaz de chegar nela e pedir pra acompanhar ela.
O que era o valentão logo respondeu:
- Mas isso nem tem dúvida que sou eu!
Os rapazes fizeram uma vaca entre eles:
- Tá aqui o dinheiro da aposta. Vamos ver agora.
E o valentão foi e os outros foram embora pra casa.
O moço então chegou pra moça e pediu pra ela se podia levar ela pra casa. Ela parou (e era bonita mesmo!) e disse, muito calma, pro moço, que não convinha ele acompanhar. Mas o tal era muito teimoso e insistiu. Ela disse: "faça então o que quiser."
Foram andando. O moço tentava beijar ela e dar uns abraços e ela não deixava. Mas chegou a pegar na mão dela e viu que estava muito gelada. Quando chegaram na porta do cemitério, a moça parou.
E o moço:
- Ué, que idéia é essa? Parar aqui! Vamos embora pra sua casa.
A moça diz que olhou bem pra ele e disse:
- Mas minha casa é aqui mesmo, moço.
Diz que deu uma bruta tremedeira nele, mas a moça só falou:
_ ... e aprenda nunca mexer com quem não conhece. O que te vale é essa medalha de São Jorge que você tem aí na palma da mão.
E aquelas feições dela, tão bonita, começou a se esfumaçar e ela ficou com cara de caveira. E depois entrou como se fosse fumaça pelos vãos do portão do cemitério e sumiu no ar.
No outro dia a turma veio toda pra dar o dinheiro pra ele que ele tinha ganho da aposta, e perguntando se ele tinha se saído bem com a moça.
O rapaz não abriu a boca. Só disse:
- Guardem esse dinheiro. Comigo já não tem mais dessas brincadeiras.
(José Maria Saes Rosa)
Numa cidade viviam três rapazes que se davam muito entre eles e que não se largavam nunca
Moravam todos juntos numa casa, assim que nem uma espécie de república de estudantes.
Eram muito farristas e mulherengos. Era só chegar sábado, já procuravam saber onde é que tinha algum baile ou festa pra irem. E não faziam conta de andar; podia ser léguas longe, davam um jeito e iam.
E tinha um dele que era o valentão do bloco; não tinha medo de nada.
Uma ocasião foram a pé num baile bem longe. Chegaram lá, a festa estava muito boa e os três amigos se divertiam muito. O baile estava cheio de moças bonitas e eles, então, faziam até apostas pra ver quem tirava uma ou outra que tinham achado mais linda.
Quando bateu meia-noite, o que tinha mais juízo, lembrando na pernada que tinham que fazer pra voltar, lembrou a todos que já era hora de irem andando. Mas quê!, os outros nem deram confiança. A festa estava que estava mesmo de arromba.
Daí bate uma hora, duas horas, três horas... Quando foi três e meia, viram mesmo que era bom irem embora.
E vieram, então, pela estrada, cantando e dando risada e falando: "você viu que "boa" que era aquela?", "você chegou a beijar aquela morena?". Assim.
Quando entraram na cidade, naquela hora com ninguém na rua e já batendo quatro horas na igreja, viram, andando na frente deles, uma moça muito bonita, de salto alto, vestido azul e cabelo bem arrumado.
Assobiaram pra ela e ela nada; continuou andando.
Daí um deles disse:
- Olhe. Vamos fazer uma aposta: eu quero ver quem é que é capaz de chegar nela e pedir pra acompanhar ela.
O que era o valentão logo respondeu:
- Mas isso nem tem dúvida que sou eu!
Os rapazes fizeram uma vaca entre eles:
- Tá aqui o dinheiro da aposta. Vamos ver agora.
E o valentão foi e os outros foram embora pra casa.
O moço então chegou pra moça e pediu pra ela se podia levar ela pra casa. Ela parou (e era bonita mesmo!) e disse, muito calma, pro moço, que não convinha ele acompanhar. Mas o tal era muito teimoso e insistiu. Ela disse: "faça então o que quiser."
Foram andando. O moço tentava beijar ela e dar uns abraços e ela não deixava. Mas chegou a pegar na mão dela e viu que estava muito gelada. Quando chegaram na porta do cemitério, a moça parou.
E o moço:
- Ué, que idéia é essa? Parar aqui! Vamos embora pra sua casa.
A moça diz que olhou bem pra ele e disse:
- Mas minha casa é aqui mesmo, moço.
Diz que deu uma bruta tremedeira nele, mas a moça só falou:
_ ... e aprenda nunca mexer com quem não conhece. O que te vale é essa medalha de São Jorge que você tem aí na palma da mão.
E aquelas feições dela, tão bonita, começou a se esfumaçar e ela ficou com cara de caveira. E depois entrou como se fosse fumaça pelos vãos do portão do cemitério e sumiu no ar.
No outro dia a turma veio toda pra dar o dinheiro pra ele que ele tinha ganho da aposta, e perguntando se ele tinha se saído bem com a moça.
O rapaz não abriu a boca. Só disse:
- Guardem esse dinheiro. Comigo já não tem mais dessas brincadeiras.
(José Maria Saes Rosa)