Quem sou eu

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A primeira vez que ouvi uma história, ganhei o presente mais precioso da minha vida e nesse decurso de ler, ouvir e contar histórias tive o primeiro encontro com meu eu, descobri então, o fascinante universo que há em todos nós, um universo de imensurável grandeza que de forma simples e encantadora tem me feito avaliar a cada momento, minha pequenez nesta divina arte de viver! O objetivo primacial do meu trabalho é carinhosamente contagiar o público com esta arte milenar; a intenção também é resgatar a figura do contador de histórias tradicional e mostrar a importância da narração de Histórias.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A moça misteriosa

Numa cidade viviam três rapazes que se davam muito entre eles e que não se largavam nunca

Moravam todos juntos numa casa, assim que nem uma espécie de república de estudantes.

Eram muito farristas e mulherengos. Era só chegar sábado, já procuravam saber onde é que tinha algum baile ou festa pra irem. E não faziam conta de andar; podia ser léguas longe, davam um jeito e iam.

E tinha um dele que era o valentão do bloco; não tinha medo de nada.

Uma ocasião foram a pé num baile bem longe. Chegaram lá, a festa estava muito boa e os três amigos se divertiam muito. O baile estava cheio de moças bonitas e eles, então, faziam até apostas pra ver quem tirava uma ou outra que tinham achado mais linda.

Quando bateu meia-noite, o que tinha mais juízo, lembrando na pernada que tinham que fazer pra voltar, lembrou a todos que já era hora de irem andando. Mas quê!, os outros nem deram confiança. A festa estava que estava mesmo de arromba.

Daí bate uma hora, duas horas, três horas... Quando foi três e meia, viram mesmo que era bom irem embora.

E vieram, então, pela estrada, cantando e dando risada e falando: "você viu que "boa" que era aquela?", "você chegou a beijar aquela morena?". Assim.

Quando entraram na cidade, naquela hora com ninguém na rua e já batendo quatro horas na igreja, viram, andando na frente deles, uma moça muito bonita, de salto alto, vestido azul e cabelo bem arrumado.

Assobiaram pra ela e ela nada; continuou andando.

Daí um deles disse:

- Olhe. Vamos fazer uma aposta: eu quero ver quem é que é capaz de chegar nela e pedir pra acompanhar ela.

O que era o valentão logo respondeu:

- Mas isso nem tem dúvida que sou eu!

Os rapazes fizeram uma vaca entre eles:

- Tá aqui o dinheiro da aposta. Vamos ver agora.

E o valentão foi e os outros foram embora pra casa.

O moço então chegou pra moça e pediu pra ela se podia levar ela pra casa. Ela parou (e era bonita mesmo!) e disse, muito calma, pro moço, que não convinha ele acompanhar. Mas o tal era muito teimoso e insistiu. Ela disse: "faça então o que quiser."

Foram andando. O moço tentava beijar ela e dar uns abraços e ela não deixava. Mas chegou a pegar na mão dela e viu que estava muito gelada. Quando chegaram na porta do cemitério, a moça parou.

E o moço:

- Ué, que idéia é essa? Parar aqui! Vamos embora pra sua casa.

A moça diz que olhou bem pra ele e disse:

- Mas minha casa é aqui mesmo, moço.

Diz que deu uma bruta tremedeira nele, mas a moça só falou:

_ ... e aprenda nunca mexer com quem não conhece. O que te vale é essa medalha de São Jorge que você tem aí na palma da mão.

E aquelas feições dela, tão bonita, começou a se esfumaçar e ela ficou com cara de caveira. E depois entrou como se fosse fumaça pelos vãos do portão do cemitério e sumiu no ar.

No outro dia a turma veio toda pra dar o dinheiro pra ele que ele tinha ganho da aposta, e perguntando se ele tinha se saído bem com a moça.

O rapaz não abriu a boca. Só disse:

- Guardem esse dinheiro. Comigo já não tem mais dessas brincadeiras.

                                                                      (José Maria Saes Rosa)

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